segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Irmão bilateral ganha o dobro do unilateral em herança, decide STJ



A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aplicou a regra do artigo 1.841 do Código Civil de 2002 para modificar acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais envolvendo a participação de irmãos – um bilateral (mesmo pai e mesma mãe), outros unilaterais (filhos do mesmo pai ou da mesma mãe) – na partilha de bens deixados por irmão falecido.

O artigo determina que, “concorrendo à herança do falecido irmãos bilaterais com irmãos unilaterais, cada um destes herdará metade do que cada um daqueles herdar”.

No caso julgado, a controvérsia envolveu o correto percentual devido ao irmão bilateral e a três irmãs unilaterais na locação do apartamento deixado pelo irmão falecido, para efeito de depósito judicial de parcela relativa a aluguéis devidos ao espólio.

Segundo os autos, o falecido indicou o irmão bilateral como único herdeiro de sua parte nos bens deixados pela mãe. As irmãs ingressaram na Justiça questionando a validade do testamento. O tribunal mineiro admitiu a inclusão das irmãs unilaterais no inventário e determinou o depósito em juízo de um terço do valor do aluguel do imóvel.

As irmãs recorreram ao STJ, sustentando que a decisão violou o artigo 1.841 do Código Civil ao determinar que apenas um terço do valor do aluguel do imóvel que caberia ao herdeiro falecido fosse depositado em juízo. Alegaram que o percentual correto deveria ser elevado para no mínimo três quintos, equivalentes a 60% do valor do aluguel.

Irmão bilateral
Citando doutrinas e precedentes, o relator do recurso especial, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, concluiu que, de acordo com a fórmula de cálculo extraída do artigo 1.841 do Código Civil, cabe ao irmão bilateral o dobro do devido aos irmãos unilaterais na divisão da herança, atribuindo-se peso dois para cada irmão bilateral e peso um para cada irmão unilateral.

“No caso dos autos, existindo um irmão bilateral e três irmãs unilaterais, a herança divide-se em cinco partes, sendo dois quintos para o irmão germano e um quinto para cada irmã unilateral, totalizando para elas 60% (ou três quintos) do patrimônio deixado pelo irmão unilateral falecido”, concluiu o relator.

Segundo o ministro, não há dúvida de que o irmão bilateral, como herdeiro legítimo de seu irmão falecido, tem direito a uma parte da herança e pode levantar os aluguéis correspondentes a essa parcela.

Assim, por unanimidade, a Turma decidiu que, enquanto persistir a polêmica em torno da validade do testamento deixado pelo irmão falecido em favor do irmão bilateral, as irmãs têm direito a 60% do montante dos aluguéis auferidos com a locação do imóvel, ficando o irmão bilateral com 40%.

Superior Tribunal de Justiça

domingo, 22 de setembro de 2013

Dirceu foi condenado sem provas, diz o grande jurista Ives Gandra Martins


O STF pela primeira vez no Brasil adotou uma Teoria duvidosa a do DOMÍNIO DOS FATOS abandonando a Teoria tradicional  em que A DÚVIDA FAVORECE O RÉU. Com ela (domínio dos fatos), eu passo a trabalhar com indícios e presunções. Eu não busco a verdade material. Você tem pessoas que trabalham com você. Uma delas comete um crime e o atribui a você. E você não sabe de nada. Não há nenhuma prova senão o depoimento dela - e basta um só depoimento. Como você é a chefe dela, pela teoria do domínio do fato, está condenada, você deveria saber. Todos os executivos brasileiros correm agora esse risco. É uma insegurança jurídica monumental. Como um velho advogado, com 56 anos de advocacia, isso me preocupa. A teoria que sempre prevaleceu no Supremo foi a do "in dubio pro reo" [a dúvida favorece o réu].

Adriano Vizoni/Folhapress
O jurista Ives Gandra Martins durante evento em São Paulo

O ex-ministro José Dirceu foi condenado sem provas. A teoria do domínio do fato foi adotada de forma inédita pelo STF (Supremo Tribunal Federal) para condená-lo.

Sua adoção traz uma insegurança jurídica "monumental": a partir de agora, mesmo um inocente pode ser condenado com base apenas em presunções e indícios.
Quem diz isso não é um petista fiel ao principal réu do mensalão. E sim o jurista Ives Gandra Martins, 78, que se situa no polo oposto do espectro político e divergiu "sempre e muito" de Dirceu.

Com 56 anos de advocacia e dezenas de livros publicados, inclusive em parceria com alguns ministros do STF, Gandra, professor emérito da Universidade Mackenzie, da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e da Escola Superior de Guerra, diz que o julgamento do escândalo do mensalão tem dois lados.

Um deles é positivo: abre a expectativa de "um novo país" em que políticos corruptos seriam punidos.

O outro é ruim e perigoso pois a corte teria abandonado o princípio fundamental de que a dúvida deve sempre favorecer o réu.

Folha - O senhor já falou que o julgamento teve um lado bom e um lado ruim. Vamos começar pelo primeiro.
Ives Gandra Martins - O povo tem um desconforto enorme. Acha que todos os políticos são corruptos e que a impunidade reina em todas as esferas de governo. O mensalão como que abriu uma janela em um ambiente fechado para entrar o ar novo, em um novo país em que haveria a punição dos que praticam crimes. Esse é o lado indiscutivelmente positivo. Do ponto de vista jurídico, eu não aceito a teoria do domínio do fato.

Folha - Por quê?
Ives Gandra Martins - Com ela, eu passo a trabalhar com indícios e presunções. Eu não busco a verdade material. Você tem pessoas que trabalham com você. Uma delas comete um crime e o atribui a você. E você não sabe de nada. Não há nenhuma prova senão o depoimento dela -e basta um só depoimento. Como você é a chefe dela, pela teoria do domínio do fato, está condenada, você deveria saber. Todos os executivos brasileiros correm agora esse risco. É uma insegurança jurídica monumental. Como um velho advogado, com 56 anos de advocacia, isso me preocupa. A teoria que sempre prevaleceu no Supremo foi a do "in dubio pro reo" [a dúvida favorece o réu].

Folha - Houve uma mudança nesse julgamento?
Ives Gandra Martins - O domínio do fato é novidade absoluta no Supremo. Nunca houve essa teoria. Foi inventada, tiraram de um autor alemão, mas também na Alemanha ela não é aplicada. E foi com base nela que condenaram José Dirceu como chefe de quadrilha [do mensalão]. Aliás, pela teoria do domínio do fato, o maior beneficiário era o presidente Lula, o que vale dizer que se trouxe a teoria pela metade.
Folha - O domínio do fato e o "in dubio pro reo" são excludentes?
Ives Gandra Martins - Não há possibilidade de convivência. Se eu tiver a prova material do crime, eu não preciso da teoria do domínio do fato [para condenar].

Folha - E no caso do mensalão?
Ives Gandra Martins - Eu li todo o processo sobre o José Dirceu, ele me mandou. Nós nos conhecemos desde os tempos em que debatíamos no programa do Ferreira Netto na TV [na década de 1980]. Eu me dou bem com o Zé, apesar de termos divergido sempre e muito. Não há provas contra ele. Nos embargos infringentes, o Dirceu dificilmente vai ser condenado pelo crime de quadrilha.

Folha - O "in dubio pro reo" não serviu historicamente para justificar a impunidade?
Ives Gandra Martins - Facilita a impunidade se você não conseguir provar, indiscutivelmente. O Ministério Público e a polícia têm que ter solidez na acusação. É mais difícil. Mas eles têm instrumentos para isso. Agora, num regime democrático, evita muitas injustiças diante do poder. A Constituição assegura a ampla defesa -ampla é adjetivo de uma densidade impressionante. Todos pensam que o processo penal é a defesa da sociedade. Não. Ele objetiva fundamentalmente a defesa do acusado.

Folha - E a sociedade?
Ives Gandra Martins - A sociedade já está se defendendo tendo todo o seu aparelho para condenar. O que nós temos que ter no processo democrático é o direito do acusado de se defender. Ou a sociedade faria justiça pelas próprias mãos.

Folha - Discutiu-se muito nos últimos dias sobre o clamor popular e a pressão da mídia sobre o STF. O que pensa disso?
Ives Gandra Martins - O ministro Marco Aurélio [Mello] deu a entender, no voto dele [contra os embargos infringentes], que houve essa pressão. Mas o próprio Marco Aurélio nunca deu atenção à mídia. O [ministro] Gilmar Mendes nunca deu atenção à mídia, sempre votou como quis.
Eles estão preocupados, na verdade, com a reação da sociedade. Nesse caso se discute pela primeira vez no Brasil, em profundidade, se os políticos desonestos devem ou não ser punidos. O fato de ter juntado 40 réus e se transformado num caso político tornou o julgamento paradigmático: vamos ou não entrar em uma nova era? E o Supremo sentiu o peso da decisão. Tudo isso influenciou para a adoção da teoria do domínio do fato.

Folha - Algum ministro pode ter votado pressionado?
Ives Gandra Martins - Normalmente, eles não deveriam. Eu não saberia dizer. Teria que perguntar a cada um. É possível. Eu diria que indiscutivelmente, graças à televisão, o Supremo foi colocado numa posição de muitas vezes representar tudo o que a sociedade quer ou o que ela não quer. Eles estão na verdade é na berlinda. A televisão põe o Supremo na berlinda. Mas eu creio que cada um deles decidiu de acordo com as suas convicções pessoais, em que pode ter entrado inclusive convicções também de natureza política.

Folha - Foi um julgamento político?
Ives Gandra Martins - Pode ter alguma conotação política. Aliás o Marco Aurélio deu bem essa conotação. E o Gilmar também. Disse que esse é um caso que abala a estrutura da política. Os tribunais do mundo inteiro são cortes políticas também, no sentido de manter a estabilidade das instituições. A função da Suprema Corte é menos fazer justiça e mais dar essa estabilidade. Todos os ministros têm suas posições, políticas inclusive.
Folha - Isso conta na hora em que eles vão julgar?
Ives Gandra Martins - Conta. Como nos EUA conta. Mas, na prática, os ministros estão sempre acobertados pelo direito. São todos grandes juristas.

Folha - Como o senhor vê a atuação do ministro Ricardo Lewandowski, relator do caso?
Ives Gandra Martins - Ele ficou exatamente no direito e foi sacrificado por isso na população. Mas foi mantendo a postura, com tranquilidade e integridade. Na comunidade jurídica, continua bem visto, como um homem com a coragem de ter enfrentado tudo sozinho.

Folha - E Joaquim Barbosa?
Ives Gandra Martins - É extremamente culto. No tribunal, é duro e às vezes indelicado com os colegas. Até o governo Lula, os ministros tinham debates duros, mas extremamente respeitosos. Agora, não. Mudou um pouco o estilo. Houve uma mudança de perfil.

Folha - Em que sentido?
Ives Gandra Martins - Sempre houve, em outros governos, um intervalo de três a quatro anos entre a nomeação dos ministros. Os novos se adaptavam à tradição do Supremo. Na era Lula, nove se aposentaram e foram substituídos. A mudança foi rápida. O Supremo tinha uma tradição que era seguida. Agora, são 11 unidades decidindo individualmente.

Folha - E que tradição foi quebrada?
Ives Gandra Martins - A tradição, por exemplo, de nunca invadir as competências [de outro poder] não existe mais. O STF virou um legislador ativo. Pelo artigo 49, inciso 11, da Constituição, Congresso pode anular decisões do Supremo. E, se houver um conflito entre os poderes, o Congresso pode chamar as Forças Armadas. É um risco que tem que ser evitado. Pela tradição, num julgamento como o do mensalão, eles julgariam em função do "in dubio pro reo". Pode ser que reflua e que o Supremo volte a ser como era antigamente. É possível que, para outros [julgamentos], voltem a adotar a teoria do "in dubio pro reo".

Folha -Por que o senhor acha isso?

Ives Gandra Martins - Porque a teoria do domínio do fato traz insegurança para todo mundo.

Da Folha

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Não há diálogo entre Joaquim Barbosa e juízes. ‘A relação é fria’

Nino Toldo - Ajufe

O presidente da Associação dos Juízes Federais (Ajufe), Nino Toldo, se queixa da postura do presidente do STF(Joaquim Barbosa) em relação à magistratura, defende novos tribunais federais e afirma que juízes federais são mal remunerados.

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, é conhecido por ter um temperamento difícil e por críticas abertas a colegas magistrados. No entanto, para o presidente da Associação dos Juízes Federais (Ajufe), Nino Toldo, a falta de diálogo de Barbosa com a magistratura como um todo tem se tornado um obstáculo para avanços no Poder Judiciário.

Nesta entrevista ao iG , Toldo admite que existe animosidade entre os juízes federais e o chefe do Supremo, iniciada antes mesmo de Barbosa tomar posse como presidente da suprema corte em 2012. “Eu sempre busquei o diálogo e tenho dialogado com todos os setores no âmbito dos Três Poderes. A dificuldade única que encontro com o presidente do STF. Lamento que isso aconteça porque não contribui de forma nenhuma para o aprimoramento das instituições”, afirma. 

Toldo admite ser difícil compatibilizar uma decisão judicial independente dos anseios populares, declara que o Supremo tem tido extremas dificuldades técnicas durante o julgamento do mensalão e afirma que salário líquido de R$ 16 mil é insuficiente para as responsabilidades de um juiz federal. “O juiz federal hoje é mal remunerado”, diz.

Leia abaixo os principais trechos da entrevista:

Joaquim Barbosa e o ministro Ricardo Lewandowski

iG – O ministro Joaquim Barbosa classificou como “sorrateira” a articulação da Ajufe com deputados para a criação de quatro novos Tribunais Regionais Federais (TRF). Esse episódio eliminou o diálogo entre o presidente do STF e os magistrados federais?
Nino Toldo – Não há diálogo, a relação é fria. Não por parte da Ajufe, não por minha parte. A Ajufe sempre dialogou. Eu sempre busquei o diálogo e tenho conversado com todos os setores no âmbito dos Três Poderes. A dificuldade única que encontro é com o presidente do STF. Lamento que isso aconteça porque não contribui de forma nenhuma pro aprimoramento das instituições. Eu tinha com o presidente Ayres Britto um diálogo muito franco, muito direto, muito aberto. E antes até mesmo do ministro Joaquim Barbosa tomar posse, em visita a ele, eu disse que esperava que, com ele, tivesse um relacionamento assim franco, direto e leal. E, infelizmente, por força de circunstâncias que eu não saberia explicar, não sei ao que atribuir tamanha animosidade.

iG – O Judiciário tem sido colocado em xeque em função de decisões consideradas políticas, como algumas condenações no mensalão. Dá para se falar que hoje a Justiça vive uma crise institucional?
NTA Ação Penal 470 representa um marco na jurisdição criminal brasileira. Foi a primeira ação de grande vulto no STF envolvendo pessoas de graduadas posições na República. A jurisdição criminal brasileira será afetada por essas decisões. Tudo que vier do julgamento será adotado em outras instâncias da Justiça. Mas o juiz não pode se deixar levar pela opinião pública para proferir um julgamento. Juiz deve se pautar exclusivamente pelas provas que são produzidas durante o processo de instrução processual e proferir sua decisão com total independência. Independência essa que é um pilar da democracia.

iG – Mas hoje como um juiz pode conseguir aliar essa independência e os anseios populares? O Supremo, no julgamento dos embargos infringentes, vive justamente essa polêmica...
 NT – Às vezes é muito difícil se compatibilizar isso. Por quê? Porque pode haver uma falha procedimental, quer na investigação, quer no decorrer da instrução processual. E o juiz, ao final, pode ter uma nulidade de sentença condenatória ainda que ele, no seu pensamento, projetasse uma condenação. Ali ocorre uma decisão não esperada pela sociedade. Mas, entre agradar a sociedade e resguardar um princípio, os juízes devem resguardar princípios. Porque isso vai se refletir em outras ações. O juiz não pode se deixar levar por anseios populares até sob pena de proferir uma decisão injusta.

iG – O julgamento do mensalão mostra uma divisão na Corte entre decisões técnicas e aquelas para atender clamores da sociedade?
NT – Eu não posso me manifestar sobre o mérito do caso em curso. Mas, assistindo aos debates dos ministros, percebe-se claramente uma divisão. O STF tem uma grande dificuldade no julgamento de causas de competência originária (ações iniciadas no e pelo Supremo). E isso não é crítica a nenhum ministro especificamente. Eu tenho defendido há muito tempo que a competência originária de instâncias superiores deveria ser extinta. Os casos devem começar a ser julgados no juiz de base, depois os recursos julgados nos tribunais de Justiça e, dependendo do caso, subir ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao STF. Isso porque, a instrução processual, a forma de se produzir a decisão judicial, é muito complexa. É o juiz (de primeira instância) que vai colhendo a prova, vai fazendo a sua convicção e o papel dos tribunais deve limitar-se a essa revisão necessária do processo e a garantia do segundo grau de jurisdição. E a Ação Penal 470 mostra a complexidade de se fazer um julgamento com tantos magistrados envolvidos.

iG – Está em tramitação um projeto de lei para acabar com o foro privilegiado de deputados e senadores, que passariam a ser julgados por magistrados de seus estados. Isso não pode resultar em mais impunidade já que Judiciário permite muitos recursos?
NT – Não creio que haja risco. A Ajufe defende o fim da prerrogativa de foro. Não há problema de quem detém foro em ser julgado pelo juiz de primeiro grau e que ele recorra ao tribunal competente depois. Agora, o que se precisa fazer é evitar que o processo dure demasiadamente. Isso pode acontecer, mas se houver um sistema que iniba os recursos protelatórios um processo pode ser julgado em um tempo razoável sem que os tribunais superiores se envolvam. Na Ação Penal 470, por exemplo, devemos olhar que o STF permaneceu quase um semestre em apenas um único processo. Durante esse tempo todo, quantas causas importantes deixaram de ser decididas?

iG – Tramita no Congresso a reforma do Código Civil, prometendo acelerar algumas ações. Até que ponto ela ajudaria a Justiça?
NT – O que deve ser feito é um fortalecimento da Justiça de primeiro e segundo graus. É aqui que as coisas realmente acontecem, onde a maioria dos casos deveria ter um desfecho. A subida de casos para as instâncias superiores deveria ser excepcional. A distorção do sistema ocorre hoje porque é relativamente fácil subir um processo para o STJ e STF. O Supremo deve decidir apenas casos que digam respeito à interpretação da Constituição. Mas a nossa Carta Magna é tão complexa que qualquer ação pode ter uma interpretação constitucional e, assim, o caso sobe para o STF. Houve no passado uma maleabilidade para que todo tipo de recurso subisse e hoje o STF está congestionado. Os ministros trabalham muito e mesmo assim não conseguem dar vazão aos processos. O Código Civil original é bom, mas tem se mostrado insuficiente para resolver os problemas atuais da Justiça. Se dará certo a reforma, só o tempo dirá.

iG – Os juízes federais alegam que um dos pontos para dar maior celeridade à Justiça será a criação de novos TRF. Até que ponto isso pode dar certo?
NT – A criação de novos Tribunais Federais ajuda a dar maior vazão aos processos, porque há uma ampliação de magistrados e readequação dos tribunais, facilitando o acesso do cidadão à Justiça de segundo grau. Esse projeto causou polêmica após ser aprovada a PEC 73 na Câmara e depois de promulgado houve uma decisão do presidente do STF, suspendendo os efeitos da Emenda Constitucional. Eu penso que essa suspensão não atende aos anseios da sociedade. O ideal é que os tribunais sejam instalados para que ocorra o redimensionamento da Justiça Federal. Mesmo com a criação destes tribunais, outros precisam ser ampliados. E cito o TRF da 3ª região, que tem sede em São Paulo e 43 desembargadores. Esse número é insuficiente para toda a quantidade de processos que tramitam por essa região. Investir na Justiça é um bom investimento. Investir na Justiça é dar celeridade a ela.

iG – Entre os juízes federais, há uma grande reclamação quanto ao salário líquido R$ 16 mil da classe. É uma má remuneração?
NT – O juiz federal é mal remunerado. Não ganha o suficiente frente às suas responsabilidades. E isso causa uma grande frustração. Essa é uma questão que me preocupa muito. O juiz ingressa na carreira hoje e praticamente tem a mesma remuneração ao longo dos anos que se dedica à profissão. Não há nenhum estímulo ao longo do tempo para prosseguir na função. E isso é muito perigoso. As pessoas de um modo geral precisam estar motivadas com o seu trabalho e o juiz federal não é diferente. A magistratura não trabalha numa lógica de mercado. Quando ele ingressa na carreira não deseja, em princípio, largá-la. Mas temos visto pessoas deixando o cargo, ou para voltar para advocacia ou para prestar concurso. Isso é uma anomalia do sistema.

Por Wilson Lima - iG Brasília

domingo, 1 de setembro de 2013

CNJ cria resolução com regras do PJe - Processo Judicial eletrônico, confira

Está pronto o texto da minuta de resolução que definirá as regras para a implantação e o funcionamento do PJe (Processo Judicial Eletrônico) nos tribunais de todo o País. A versão final, que será analisada pelo Plenário do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), recebeu várias sugestões durante consulta pública que ocorreu no final do ano passado.

Foram apresentadas 108 propostas de tribunais, escritórios de advocacia, defensores e advogados públicos, procuradores, empresas de tecnologia de informação e membros da Ordem dos Advogados do Brasil.

Todas as sugestões oferecidas foram avaliadas pela Comissão de Tecnologia da Informação e Infraestrutura do CNJ e cada uma das proposições foi respondida pela comissão. A partir daí a equipe reformulou o texto que será apreciado pelos conselheiros. Entre as propostas acatadas está a possibilidade de acessar o sistema PJe por meio de identificação de usuário e senha, e não somente por assinatura eletrônica. Só não será possível, nesse tipo de acesso, assinar documentos e arquivos e atuar em processos sigilosos.

Outra modificação no texto após a consulta pública é a possibilidade de se peticionar em papel, no caso de o sistema ficar indisponível, e do envio de arquivos não assinados digitalmente, desde que a assinatura seja feita em até cinco dias, em uma analogia com o envio de fax. Em relação aos atos processuais, todas as citações, intimações e notificações serão feitas por meio eletrônico, inclusive da Fazenda Pública, do Ministério Público e da Defensoria Pública, conforme prevê a Lei n. 11.419/2006.

Pela proposta em estudo, o uso do PJe continuará facultativo, cabendo a cada tribunal decidir se adere ou não ao sistema. Já o modelo de interoperabilidade será obrigatório: todos os sistemas que forem desenvolvidos pelos tribunais terão necessariamente de seguir o padrão que permita o intercâmbio de informações com o PJe e outros sistemas do Judiciário, conforme determinado na Resolução Conjunta CNJ/CNMP n. 3.

A padronização do modelo tem como objetivo evitar a proliferação no Judiciário de sistemas incompatíveis com os de outros tribunais. Na ausência de parâmetros, os tribunais vinham implantando diferentes sistemas que não têm interoperabilidade, ou seja, cada tribunal é uma ilha. Com a interoperabilidade, os tribunais poderão trocar informações com todos os órgãos do Poder Judiciário e dos demais integrantes do sistema de Justiça, notadamente do Ministério Público.

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