O prazo para o consumidor reclamar de defeito ou vício oculto de
fabricação, não decorrentes do uso regular do produto, começa a contar a partir
da descoberta do problema, desde que o bem ainda esteja em sua vida útil,
independentemente da garantia.
O entendimento é da 4ª Turma do STJ, que manteve rejeição de cobrança
por reparo de trator que apresentou defeito três anos depois de vendido. A loja
ainda deverá ressarcir o consumidor Francisco Schlager pelo tempo em que a
máquina ficou indisponível para uso em razão da manutenção.
O precedente é interessante, mas está expresso em processo de demorada
tramitação no STJ, onde o recurso chegou em outubro de 2007 - cinco anos,
portanto.
A empresa catarinense Sperandio Máquinas e Equipamentos Ltda., vendedora
do trator, buscava no STJ receber os quase R$ 7 mil equivalentes ao conserto do
bem. Ela alegava que o defeito surgiu quando o prazo de garantia do produto -
de oito meses ou mil horas de uso - já havia vencido.
Segundo a loja, o problema deveria ser considerado desgaste natural
decorrente do uso do produto por mais de três anos. Ela pretendia ainda
reverter a condenação por lucros cessantes obtida pelo consumidor em
reconvenção.
O ministro Luis Felipe Salomão rejeitou os argumentos da fornecedora.
Para o relator, ficou comprovado que se tratava de defeito de fabricação. Em
seu voto, ele citou testemunhas que afirmaram ter ocorrido o mesmo problema em
outros tratores idênticos, depois de certo tempo de uso. As instâncias
ordinárias também apuraram que a vida útil do trator seria de 10 mil horas, o
que equivaleria a cerca de dez ou doze anos de uso.
Para o relator, "o Judiciário deve combater práticas
abusivas como a obsolescência programada de produtos duráveis". Segundo
Salomão, essa prática consiste na redução artificial da durabilidade de
produtos e componentes, de modo a forçar sua recompra prematura, e é adotada
por muitas empresas desde a década de 20 do século passado.
O julgado estabeleceu que, por se tratar de vício oculto, o prazo
decadencial deve ser contado a partir do momento em que o defeito for
evidenciado. O ministro Salomão afirmou, porém, que "o fornecedor
não será eternamente responsável pelos produtos colocados em circulação, mas
também não se pode limitar a responsabilidade ao prazo contratual de garantia
puro e simples, que é estipulado unilateralmente pelo próprio fornecedor".
Segundo o relator, a obrigação do fornecedor em consertar o produto
acaba depois de esgotada a vida útil do bem. A doutrina consumerista
tem entendido que o Código
de Defesa do Consumidor, no parágrafo 3º do artigo 26, no que concerne à disciplina do vício
oculto, adotou o critério da vida útil do bem, e não o critério da garantia,
podendo o fornecedor se responsabilizar pelo vício em um espaço largo de tempo,
mesmo depois de expirada a garantia contratual - concluiu.
(REsp
nº 984106)